a infinita ausência

Friday, July 01, 2011

1 de Julho de 2011

Querida Teresa



Voltei há uma semana para esta minha estimada cidade, cada vez menos minha, cada vez mais corrompida por um cosmopolitismo que não se coaduna com uma população cuja cultura milenar sempre fora centrada na simplicidade, nos ritos e nas superstições. Em cada esquina e ruela apertadas ressoam o sino da cidade do meu passado, longínquo e perto ao mesmo tempo, como se a menina que eu era, correndo alegremente a calçada livre de pegadas forasteiras de hoje, ainda residisse aí. Todavia sei que a essência deste pequeno mundo transformou radicalmente para algo que não sei definir, porque me é totalmente estranha. Por isso, trago um rasgo de amargura no meu olhar que perdura no meu sorriso quando reencontro familiares e conhecidos na rua.


Curiosamente não tive uma réstia de intenção de ir ao teu encontro, como em outrora. Sabes que ao longo de anos e meses de silêncio, sempre propositadamente cultivado da tua parte, e de circunstâncias naturais mas adversas e inesperadas que passei, fizeram com que hoje me sinta diferente e tenha a visão do mundo e das coisas também diferente. Não te vou explicar detalhadamente do que sucedera, pois conviria acontecer numa conversa a duas, pessoalmente, para que tu possas saber e sentir do que estou a dizer. O que importa aqui referir, é o facto de, sem esperar e sem desejar te vi e te encontrei. Um pouco mais de 14 horas atrás, surgiste inesperadamente, esbelta, subtil, leve, reluzente, miraculosa, bela até doer - sorrindo. Quando te vi, pude aperceber-me em total plenitude cada metamorfose que os amantes são forçados a passar, quando a seta do Cupido os fere profundamente, sem dó nem piedade. Pensei que a minha seta já tivesse sido extraída e a ferida cicatrizada com o tempo, com outros rostos, corpos, beijos humedecidos. Tentei com algum esforço em ter graça sem ser engraçada, comunicativa sem dizer nada de relevante, esconder o meu embaraço que se avivava com o pulsar frenético do meu coração a quedar em pique. Lembro-me de outras visitas que te fizera no passado, nunca me concedias mais do que 5 minutos, desta vez ouviste-me falar atentamente, pela primeira vez senti que não estavas a escorraçar-me. Provavelmente deveu-se ao facto de conseguir controlar a minha timidez e desapegar-me à ideia de que és a deusa imortal e invencível dos meus sonhos mais recônditos. Posso continuar a pensar dessa forma, e indubitavelmente penso, mas agir como se tal não tivesse importância; pois é tudo uma questão de auto-controlo e de chamar a voz da razão para abafar a da emoção que descarrila desvairadamente.


Depois já não consegui parar de pensar em ti, de suspirar, de esperar que mais um encontro ocasional pudesse acontecer, porque não vou chamar-te pela minha voz, não vou abarcar-te com os meus braços, não vou seguir os teus passos com os meus. Pois, se eu os fizer, já não seria a mesma coisa, já não reagirias da mesma forma, já não valerá a pena. Assim, espero-te, como sempre, porque mesmo que não surjas em pessoa, em qualquer parte do mundo eu vejo-te com clara nitidez: "Em todas as ruas te encontro, em todas as ruas te perco".

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