19 de Novembro de 2007
Querida Teresa:
A chuva e o frio trouxeram-me uma letargia tumular, que pressinto ser de difícil abandono. Mal comecei a semana, o meu corpo pede repouso e os meus olhos de abrigo na penumbra de um quarto sossegado. Talvez o Natal também me tenha trazido a nostalgia familiar, que contém em si a ambivalência de dois gumes; a saudade de uma infância quase feliz e a consciência da infelicidade na idade adulta, como se a obscuridade fosse luz para o insatisfeito, que não há-de cessar a sua íntima procura da evolução interior. No entanto, é evidente que o peso que me imponho a suportar relativamente a exigências emocionais e intelectuais, verga-me as costas, torce-me a pena, e acaba por se desfazer em pó e cinza. E nada pior para um harpista de poesia, não sentir a ondulação perfeita dos sons nos dedos, não se comover, não deixar embebedar-se por ela.
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