a infinita ausência

Tuesday, November 20, 2007

29 de Novembro de 2007

Querida Teresa:

Apesar das tarefas inadiáveis e das preocupações constantes, tens vindo dançar subtilmente no meu pensamento, como uma velha amiga desaparecida. Como se soubesses, algures na tua ilha longínqua e inacessível, que padeço em silêncio; não só porque efectivamente deixei de te pertencer mas também porque aquela angústia tão nossa e tão pessoana me tem caiado o seio de sufoco. Tomara conseguir dizer-te isto, como nos velhos tempos, correr de braços abertos para o nosso abrigo virtual e deixar naturalmente escorrer as palavras como lágrimas, e depois receber as tuas, tão fascinantes, tão raras, tão sagradas. Mas, o tempo mudou-me, oprimiu-me o coração; e a tua mudez coseu-me os lábios claros onde um mar de beijos interditos mordiam incessantemente o teu nome.

12 de Dezembro de 2007

Querida Teresa:

Os dias têm-me parecido mais longos, é por estar na época de exames que tenho usufruido o direito de ficar uns dias em casa sem trabalhar. O que é óptimo para quem precisa de repousar o corpo como se voltasse de uma longa caminhada com os pés doridos, e os olhos cheios de pó da estrada. Às vezes é assim que me sinto, todos os dias faço uma viagem (na minha pequena terra) a partir do momento em que saio de casa até o regresso, apesar das mesmas caras matinais em que me encontro na paragem de autocarros, das mesmas conversas sobre o quotidiano em que travo com os colegas da faculdade, do mesmo tédio que partilho com os colegas do trabalho.
Não tenho sentido gravemente a tua falta, creio que finalmente te mistifiquei, tornando-te um mito, isto é, estás morta, divinamente extinta. Só através da palavra poderei te evocar, te falar para que me oiças verdadeiramente, quem sabe um dia...

6 de Dezembro de 2007

Querida Teresa:

Hoje a noite está esplêndida, consegui tirar essa conclusão nos breves 5 minutos em que fui colocar a reciclagem; a aragem suave atravessou-me com uma quietude surpreendente, que me fez desejar estar ali imóvel com os sacos na mão, indiferente com a passagem dos carros e dos transeuntes. Mas, lembrei-me de súbito que tinha trabalhos para entregar e para a semana tenho dois testes importantes, são aquelas cadeiras que um verdadeiro amante de letras é obrigado a passar com distinção. Luto diariamente para me afigurar entre os melhores, porque creio que só assim um dia poderei finalmente trabalhar com prazer, e se o meu talento for reconhecido por meia dúzia de loucos como dizia Al Berto, já morreria feliz.

22 de Novembro de 2007

Querida Teresa:

Há três dias que ando doente com o vírus da gastroenterite a brincar com os meus intestinos desprovidos de armas para o combate, já que a rainha guerreira que comanda as tropas do seu corpo, está, de igual modo, ferida. Pelo tempo que colhe insensivelmente a efemeridade dos meus dias atulhados de tarefas, na maior parte, inúteis; pela letargia que emergiu do pélago há muito tranquilo no fundo da minha alma; pelas ideias negativas que tumultam o meu pensamento, noite e dia, sobre o meu desempenho nas funções académicas, que me têm deixado céptica, insegura, macambúzia. E a eterna questão alvorece as minhas manhãs: será que vale a pena o sacrifício? Depois, o mestre, o homem que me despertou a consciência murmura, gélido e insistente no seu sepulcro espiritual: "tudo vale a pena, se a alma não é pequena".

19 de Novembro de 2007

Querida Teresa:

A chuva e o frio trouxeram-me uma letargia tumular, que pressinto ser de difícil abandono. Mal comecei a semana, o meu corpo pede repouso e os meus olhos de abrigo na penumbra de um quarto sossegado. Talvez o Natal também me tenha trazido a nostalgia familiar, que contém em si a ambivalência de dois gumes; a saudade de uma infância quase feliz e a consciência da infelicidade na idade adulta, como se a obscuridade fosse luz para o insatisfeito, que não há-de cessar a sua íntima procura da evolução interior. No entanto, é evidente que o peso que me imponho a suportar relativamente a exigências emocionais e intelectuais, verga-me as costas, torce-me a pena, e acaba por se desfazer em pó e cinza. E nada pior para um harpista de poesia, não sentir a ondulação perfeita dos sons nos dedos, não se comover, não deixar embebedar-se por ela.

Friday, November 09, 2007

12 de Novembro de 2007

Querida Teresa:

Hoje por mero acaso me encontrei a navegar no site da instituição onde trabalhas. Saudei-te levemente com o cursor, como se cada curva assombrosa do teu nome fosse uma missanga do teu cabelo perfumado, como se eu, de facto, pudesse estar a senti-lo.
Lembrei-me, inevitavelmente, do nosso último encontro, em que de novo mal sei do que te falei, enquanto tudo o que falaste está cerrado nos meus punhos. Foi então que o mar da tua ausência reflectida, inundou-me o peito de sal, a saber a sonhos impossíveis - uma muda indignação contida, que agora, pude enfim, libertá-la. De facto, só a escrita permite aquietar a escuridão da masmorra do amor, da vida, de mim mesma.

9 de Novembro de 2007

Querida Teresa:

Por vezes gostava de saber como consegues viver livre de desassossegos, de forma tão natural e desprendida, sem a paixão das minhas palavras, que dizias ser o único momento de poesia do teu dia. O meu silêncio prolongado é o grito de orgulho que te lanço sem, no entanto, te atingir, porque já há muito tempo que tudo que emana das minhas mãos, é-te indiferente. Apesar de sermos ambas balanças, não consigo ascender até esse teu elevado grau de desprendimento relativamente a sentimentos - tu abafas o amor na alcova segura e estéril, que te devolve somente o sabor agreste do hábito.
Infelizmente os deuses não me poderão responder se na próxima vida, época, circunstância menos complexa, eu poderei, enfim, naufragar no mar sem tormenta do teu corpo interdito...